- não sei porque acordo a ver-te acordar, porque adormeço a ver-te adormecer, porque eu nunca ti vi adormecer e nunca te vi acordar. Não sei porque te oiço cantar a minha canção preferida, a que fala de madrugada, porque eu nunca ouvi a gargalhada com que acordas a alvorada, nunca escutei a paixão das nossas noites não destinadas. Não sei. Quando te digo que podia ter mil amores, na verdade não poderia ter nenhum, jamais mil amores seriam um, mas o teu amor sim seria mil amores.
Todo o silêncio em mim é barulhento, não tenho silêncio nos pensamentos que esculpo, nas noites balsâmicas em que me tento abstrair de ser, neste sentir que não aprecio de todo querer.
Todo o silêncio em mim é a festa com que sonho, a guerra que almejo, a paz com que o musica em fundo me ameiga.
Não há silêncio em mim, se em mim existe vida.
Pode até silenciar-se o vento, o rio desaguar noutro mar, o grito emudecer, a cidade falecer, o vulcão transformar-se num jardim florido de lilases de flor de alecrim e lavanda, que, enquanto os meus sonhos e angustias forem desejos de perturbados amores e se enaltecerem nas minhas veias, o silêncio será sempre uma ruidosa metáfora silenciada pelo ruído da minha existência.
As saudades da saudade das madrugadas em que pouco mais éramos do que o prazer das palavras em carrossel, tanto que fomos sorriso, proximidade e construção, era única a felicidade de todas as madrugadas.
Foi só e apenas madrugadas, sempre o entendi, nunca o aceitei. Aceitei somente quando as saudades da saudade das madrugadas se tornaram só, em saudade e nada mais do que esvaziados momentos de tempo.
Não sabia o que sangram as palavras com que não te pude abraçar, vão gemendo quando desço do castelo para a cidade.