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Cardilium

Cardilium

A noite ?

Os teus olhos têm mais luz do que o mar,
Tanta revolta como o teu corpo agitado no meu,
Os teus acordares embalam os meus dias,
Os meus olhos no chão são o futuro vivo do meu passado,
O meu caminho é uma promessa sem papel assinado.

A noite ?
É o mar na luz do teu olhar.

tempo vendido de tempo

tempo inventado,

medido,

procrastinado,

sem medida,

adiado,

desabraçado, 

incoerente,

 

tempo vendido de tempo.

atempado,

isento,

desglorificado,

sem memoria,

asorto,

sem gente.

 

Para matar o tempo, até me mato a mim …

livre arbítrio

O livre arbítrio da moralidade é o falso conceito do desacordo personificado ou verbalizado do outro. O meu mundo não é a realidade do mundo social. O meu caminho não tem coordenadas indicativas emocionais. O meu mundo é o livre arbítrio da minha intuição, e a minha intuição é mais poderosa em mim do que o meu intelecto. A minha intuição é saber o que não sei saber.

 

O livre arbítrio, a moralidade e a intuição são o meu mundo sem directriz, forjadas em cada pedaço meu, em cada fragmento de vida que se me apresenta ou exclui. Não seria feliz sem o direito ao contraditório de mim para mim, particularmente. As minhas verdades cada vez têm menos certezas, e as minhas certezas cada vez têm menos verdade, e ambas são o direito evolutivo que me assiste.

 

Sobra-me a reflexão de mim para mim porque nada me vigora excluído de mim, fora de mim existe o resultado do que escolho, do que intui-o, o livre arbítrio, e o mundo social. Antes, existe o meu mundo sem coordenadas indicativas e/ou emocionais.

Num coração recuperado

O ódio na alma é como o ópio no corpo,
Dói,
Massacra,
Dilacera,
Mata,
Só a próxima dose alivia, só a próxima dose adia.

O ódio no corpo é como o ópio na alma,
Entontece e cega,
Trucida e rasga,
Estilhaça e castra,
A próxima dose mata,
O amor-próprio salva.

O ódio e a raiva,
O ópio e a calma,
São embustes de quem clama,
Promessas não prometidas,
De vida não acontecida,
O corpo cede na alma que geme.

O ódio na alma é como o ópio no corpo,
O ódio no corpo é como o ópio na alma,
O veneno e o elixir,
A mentira traída pela verdade,
A verdade ancorada,
Num coração recuperado.

erótico

Não é erótico o corpo, a boca, o andar ou o sorriso,
É erótica a cumplicidade criada mais do que a dividida,
O cheiro,
A duplicidade dos corpos,
Os acordares desgrenhados antes do café da manhã.

É erótica a alma,
Mais do que figuras ousadas do prazer inconseguido,
Mais do que frases batidas de uma luxuriosa procura de bens,
Pela divisão de nós na procura de um outro,
É erótico o tempo saboreado na conversa alcançada.

 
 

mundo entre nós divido

Havia um mundo entre nós divido pelo futuro,
E o futuro é exactamente o presente adiado.

Havia um mundo entre nós feito de mundos,
Construído por ideias,
Sustentado por ideais e sonhado.
Sonhado por um sonho sublime e desigual,
Plantado em terra fértil e nos nossos corpos fecundado.

Havia crianças e bailarinos, tambores e noites quentes de árvores silvadas ao vento,
Havia flautas feitas de cana-da-índia e lábios escondidos nos canaviais,
Havia perfumes adocicados pelas estações,
Havia murmuradas noites grávidas de manhãs, e manhãs embrulhadas de nós.

Havia mais do que o verbo haver,
Havia existir também,
Existiram lágrimas de despedida e sorrisos de reencontros,
Houve existido o teu mundo,
Houve partilhado a divisão do meu.

Houve.
E se alguma vez houve um mundo entre nós divido,
Então há,
Então existe…

desencontro

Encontrei o desencontro procurado,
A anormalidade sustentada,
As trevas domingueiras dos domingos fastidiosos clareados.

Nas silabas pronunciadas,
As letras,
Bastam-se parcas.

Abundam criteriosos opinativos acerca do amor,
Mas o amor não tem opinião, o amor fecunda na paixão,
O mundo desfaz-se num aproximado amor que nasce.

Um dia não é suficiente

Um dia não é suficiente mesmo que uma hora fosse do tamanho de um dia.

Os teus olhos são como a maresia rompida pelo sol. Antes escuros semicerrados, depois esverdeados de um mar que os invade. Tal qual a tua respiração antes, bênção dos deuses, depois, furacão embravecido evocando o meu nome sem parar, exultando que não pare de te amar. Assim me transfiguro eu na simbiose de te sentir transformada nos meus braços, que não são os meus braços, são o abraço que nos aloja, adormenta e adormece.

No céu, um corvo voa misturado com as gaivotas evocando-nos. As nossas mãos seguram-nos respirando mais do que os nossos pulmões, ora cheios, ora esvaziados pelo cansaço adormecido dos nossos corpos.

Um dia não é suficiente mesmo que uma hora fosse do tamanho de um dia.
Um dia não é suficiente mesmo que uma hora fosse do tamanho de uma noite.
Um dia não é suficiente mesmo que uma hora fosse do tamanho de uma vida.

sempre foi o sonho a comandar

No inicio apenas um sopro, o perfume e a pele,
Depois as palavras e o sorriso.

Num outro dia um acerto de um pensamento,
Mais adiante o milagre de parar o tempo.

Depois a vontade que se instalou,
E as duas vozes fundidas numa só.

E sempre foi o sonho a comandar,
O desejo de ficar.

E sempre foi um sopro, o perfume e a pele.

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