Cada uma delas abarca os meses. Os meses as semanas. As semanas os dias. Os dias as horas, e, em cada menor partícula de medição temporal, a pele absorve a emoção de sentir.
Depois existem as pessoas que nos causam arrepio: - arrepio frio, temperado, fresco e ardente.
Depois existem paisagens duras e frias e olhares quentes em qualquer estação, é nesta altura que começo a ceder e, o meu entendimento sentido, mostra-me que existem pessoas que nos alteram as estações, tanto por defeito, como por excesso.
O rosto enrugado pela dureza do frio esbate-se na sombra do seu corpo ao passar. A morte esconde-se diariamente e o olhar vigor, é onde deposita os seus olhos. Habituou-se a ver sem olhar. As sete horas nocturnas de que são feitos os seus dias, são a prisão que lhe prometeram em nome da liberdade. As encomendas, feitas numa surdina temerosa, seguem sem rota o roteiro normal do silêncio. A cama aquecida espera-o sem perguntas. Foi contrabandista. Contrabandeava sonhos. Sonhos de uma vida melhor.
Contrabandista: profissão improfícua da zona raiana de um Portugal quarentão de pseudo desenvolvido e liberdade.
… De dentro da alma da alma geme humana uma nação e, na desordem dos sentidos fico-me. Entristecido voo sem horizonte onde pousar. Na regenerada sequência balouço-me autista voltado para os declives em que me alberguei. Ensurdeço das palavras descarregadas e, num semblante inútil de choro, sorrio ao rio que me lava a saudade de pranto, já nem as tuas mãos me seguram, já nem o teu peito me cura.
Não me ofereças mais palavras desmentidas de nós …”
Cheira a flores de rosas no meu quintal. As noites têm o silêncio dos amantes. Perdura a vontade de fazer do mar companheiro e de deixar completa esta obra que é a vida. Em criança tive o encanto da inocência. Já crescido aceito o desencantamento de alguns dias da vida. O desencanto da desistência. Aceito a loucura que me tolda. Os sonhos que vou sonhado. Expresso-me mais do que transpareço e muito mais do que digo.
Cheira a lençóis lavados e frescos no meu peito, de cada vez que acordo do único sonho que tenho. Aos poucos concretizo. Concretizar é o agradecimento à existência. Todos os dias me abandono e recolho. Todas as noites entendo a ruptura como uma oportunidade. Mudo sem estratégia pensada e amadureço com as estações, sem me aperceber, entendo que tudo o que preciso não se procura, encontra-se.
Tenho como “Pessoa” e todas as pessoas em mim: “todos os sonhos do mundo” e “pedras no caminho”.
Não construirei um castelo. Construirei uma gruta e um passeio empedrado de seixos, da nascente do rio que corre desalvoraçado em mim, até ao poente. Semearei um relvado com a lua ao fundo, para que me lembre da luz que me ilumina e cega. A lua tem a cor da minha alma.
“Quem me quebrou o encanto nunca me amou”, celebrou assim o Zeca.