Acordei dum desassossego mudo. Sonhei com a felicidade. Tamanha loucura mete-me medo. Felicidade. O cheiro a terra semeada de solidão embrenha-se-me pelos poros adentro. O sol pinta a minha resistência. As palavras são surdas e duras quando em confronto. São escorreitas e doces aquando em dança na celebração da verdade.
Gosto de cegar e ver pessoas a passar. Cada passo segue uma direcção. Cada passada obedece ao sentido que lhe é ordenado. Observo a tristeza de um olhar que não enfrenta. Reajo aos risos. Entendo os sorrisos e as lágrimas que se aglutinam na rua feita de movimento. Cego, decido olhar. Subo, desço e vivo a vida na fantasia que construo com a minha cegueira. As crianças contemplam com olhar de descoberta, enquanto passeiam balões pela mão. Caminham em correria com se cada pedaço de passeio fosse um jardim imaginário. Como se cada declive fosse um baloiço, como se cada baloiço estivesse habitado por outra criança.
Subo em direcção ao Chiado prendido à esquina onde ecoam alfarrabistas do sonho das palavras. Falta-me terra. Falta-me o cheiro da terra.
A encosta da serra que me sombreia abrigou-se entre as casas. Mudaram de cor as casas de retoques coloridos. As varandas. Discreto, azul-bebé. Adiante, os passos assinalam as giestas. As flores penduram-se languidamente nas paredes. Matizam de lucidez as alvoradas. Os balões estouram num festim concebido pelo mar que se avizinha. As ondas enrolam o sonho e o sonho comanda a vida…!
Sentado defronte da noite esperei que o movimento das árvores me abraçasse. Já era mais do que madrugada calculei eu pela água jorrada da fonte nos seixos que ali nascem, e aí mesmo provém o prodígio da junção de água em vida que o rio absorve no início do seu caminho. Eu já vi nascer um rio numa noite abraçado pelo movimento das árvores.
O nosso amor morto é melhor do que moribundo, deixemos então o nosso amor morrer em paz.
Sentado defronte da noite esperei que o movimento das árvores me abraçasse. Já era mais do que madrugada calculei eu pela água jorrada da fonte nos seixos que ali nascem, e aí mesmo provém o prodígio da junção de água em vida que o rio absorve no início do seu caminho. Eu já vi nascer um rio numa noite abraçado pelo movimento das árvores.
O nosso amor morto é melhor do que moribundo, deixemos então o nosso amor morrer em paz.
A vida é uma terra por arar onde os cavalos se soltam sem direcção e livres galopam sem horizonte que lhes trave o sonho. Se não houvesse corpos a morte não tinha a quem escolher.
As estradas não percebem o caminho. As estradas são usadas como os deuses o são, desconhecidos pela oração. Os caminhos são pequenas parcelas de destinos que não entendem o trajecto e desconhecem onde habita o desejo. As cidades não se elevam das praças para as torres. As cidades são as pessoas sem destino ou direcção de encontro à direcção que o destino desconhece.
Metamorfose emocional mais do que empírica tem o caminho da vida. Como existem corpos, tanto a vida como a morte, tem onde se depositar. Deixo-te a minha voz pousada num beijo, ardendo neste abraço que desconheces.
Arde-me sôfrego este sentir. Apenas posso sentir. Somente poderei sentir o que não posso mais adiar. Este carrossel de sentires não me deixa sossegar, esta impossibilidade de adiamento julgo querer-me sufocar. Visitei na madrugada passada o mar, por momentos senti esta loucura eminente mais a saudade partirem, sem me abraçarem.
Espero que não fujas com outro a meio da noite … - minha querida liberdade -
Acordei. Espreguicei-me com o mar. Lavei o sal dos olhos de uma noite atormentada. Rezei com o nevoeiro e o arco-íris e parti. Parti para o dia deixado pela noite e a esperança que rompe com o sol as nuvens e desenha histórias no céu, como as gaivotas que beijam a terra na saudade da manhã.
Assim me cheirou este acordar.
Cheirou-me ao teu corpo acordado que me adormeceu.