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Cardilium

Cardilium

O vento leva-me

 

Canto uma canção com mágoa de um mês que ainda vem em terras de lá,

Canto debruçado na janela entreaberta,

Onde sonho ver uma sombra apressada,

Pisando a terra revoltada a caminho da porta do poema,

Vejo a rua onde vivo em Março, chorar lagrimas de Dezembro,

E oiço o vento,

E o vento passa,

E o vento leva-me até ti.

Pássaro

Se fosse um pássaro com asas,

Só um pássaro,

Só uma alma,

Voaria já sem direção,

Com destino clandestino,

Aliviar esta demência,

Sem pressa mas com urgência.

As minhas sandálias são feitas de uma matéria chamada caminho

As minhas sandálias são feitas de uma matéria chamada caminho,

Do meu coração desceram as chagas que se lhe juntaram,

De todas as vezes que tombei,

E de todas as que sobrevivi.

Ainda estou no encalço do que me sobra de trilho,

Com estas sandálias abundadas de vida,

E este inverno sobejado no meu peito,

Com a primavera intercalada nos dedos da minha mão.

Amizade

A amizade é, o estado mais próximo do amor que conheço, faz dos “ bons velhos tempos” a alegria dos “bons novos tempos”.

A amizade não tem um tempo de separação.

A facilidade de estar e sentir não é apagada pelos dias.

Parece-me sempre que foi ontem, o último dia em que estive e senti.

A amizade dos “bons novos tempos” é intemporal, rara e necessária, é o amor nos meus dias.

Ser hoje, ser agora, por hoje e por agora

Se antes não tivesse sido aquele tempo, não existia nem o agora, nem o depois.

 

Renegar o tempo que foi, é desesperançar o tempo que aí vem e tudo o que nele se encerra e detém.

 

Ser hoje, ser agora, por hoje e por agora é: somente ter a liberdade que tem o tempo que foi.

Do levante à psicanálise,

Do levante à psicanálise,

Respostas que não se oferecem,

Encontros.

 

Postura,

Encontrão que a vida dá.

Reencontro final.

 

Sobram pedaços de neve,

Cristalinas transparências,

Fundamentação desconstruída.

 

Óbvia razão existente no sentir,

Divã desnecessário,

Alegria e tristeza são: não fingir.

                                    

Padre em sacrilégio pregando riqueza e usurpando as palavras da pobreza

Ao dobrar as esquinas tenho sempre a sensação de dobrar o Bojador. Sinto-o pelo desconhecido medo, do medo que estará para além da soturna ruga.

 

Em cada vingada esquina posso sempre deparar-me com uma baía translucida de azul, onde se vê o fundo do mar imaginado;

 

- posso sempre deparar-me com um pobre desnutrido sem chama no olhar;

 

- com uma criança linda com pouca roupa para o tempo que está;

 

- com um padre em sacrilégio pregando riqueza e usurpando as palavras da pobreza.

 

Para mim, as esquinas são a vida. Metem-me medo, confrontam-me, abençoam-me e despertam em mim a realidade desajustada.

 

- Já parti das esquinas para o dia, já percorri as esquinas da noite;

 

- Já fui entre esquinas buscar mais cinco minutos de morte em nome da vida;

 

- Já calcorreei esquinas e já habitei o lado de lá das esquinas que testemunho hoje do lado de cá.