Tive que me desconstruir para a construir o meu mundo. Tive que mudar os olhos para voltar a ver. Para me voltar a ver.
Tive que mudar de mãos e deixar livre a minha decisão.
Tive que mudar de pernas e pés, a caminhada da vida usada pesava-me tanto, que não a sustentava carregada em mim. Voltei a caminhar depois com leveza e direcção.
Troquei de boca e de beijos, de braços e de abraços. Troquei pouco mas troquei o essencial.
Deixei nesta gruta nascente em mim sair a minha essência que, vivia como mineiro numa mina por descobrir.
Tive que mudar a mudança, tive que gritar palavras asfixiadas na minha garganta, aprendi palavras novas e outras que nem me lembrava.
Mudei de mundo. De barriga. De interior. De mar. De nuvens e arco iris. Mudei e troquei de luz. Subi à lua.
Na minha vida todas as trocas, desconstruções e mudanças, foram a expedição com destino a mim próprio.
Entre as serras abandonadas de homens e o mar invadido de ondas, esculpi nos meus pés e nas minhas mãos a vida com que posteriormente me incendiei. Soletrei dias a fio conversas comigo mesmo, como se a serra, o mar, e mesmo o mundo inteiro, fossem meus por inteiro igualmente, mas estilhaçados de rompantes pensamentos e urgentes dias que sabia vindouros.
Amareleci com o sol e escureci com as sombras que me protegeram. Estive desperto mais de mil noites e adormecido nos mesmos mil dias amantes dessas noites. Neste desmedido meu mundo, amadureci um homem menos acompanhado, mas vivo e recebido pelo entusiasmo de se aceitar desacompanhado e só.
Acompanhado desta solidão, escuto um mar de gente, um burburinho de bocas sabedoras e teorias inatingíveis, de conceitos silenciosos de tanto se quererem fazer ouvir.
Nunca tinha visto um luar assim, entre as serras abandonadas de homens e mar.