Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cardilium

Cardilium

metamorfose constante

Sempre vivi num sentido que não o meu,

De cada vez que o encontrei,

Deixou de o ser,

Passei a habita-lo com a vã necessidade,

De continuar esta procura sem fim.

Entendo hoje que não pertenço ao mundo,

Existem vários mundos,

Vários sentidos,

Vários eus,

 

E uma metamorfose constante e interminável.

 

Esfrangalhada papoila

Esfrangalhada papoila já sem cor,

Vista dos meus olhos,

Sem odor,

Despedaçado céu,

Pedaços de querença,

Mãos,

Hipérbole,

Fantasma,

Clamor.

 

Esfrangalhado peito que te ausentaste em fantasia e desamor.

Rio ...

Corre um rio dentro de mim,

Ora calmo e sereno,

Ora sobressaltado e incoerente.

 

Na nascente rompe de raiva,

As rochas que o sufocam,

Na limpidez das águas jorra vida.

 

Na foz já corre turvo pelo caminho esforçado que fez,

Mas sente-se ledo e alegre,

Sabedor que vai abraçar o mar.

 

Dentro de mim corre um rio cristalino e turvo,

Conhecedor do abraço que o espera …

Sem prescrever

Tens uma guilhotina no olhar que me trespassa o entendimento,

Da tua boca rebentam claves de sol,

Que me embalam.

O sol que jorras ao caminhar,

É semi-difuso,

Tanto o sinto como um aconchego,

Como um vale escuro e frio,

Que me perfura como uma guilhotina,

Com punição e hora anunciada.

 

A tua blusa desajeitada persegue-me,

Persegue-me nos sonhos que não abandono,

Persegue-me como um desfiladeiro.

E eu,

Ali,

Suado,

Amedrontado,

Sem desabar,

Sem prescrever.

 

Por ser menor a dor maior,

Arremesso-me a este lugar,

Meu de existência,

Meu de persistência,

Sufoco-me nesta imagem de céu,

De um caminho,

Iluminado de árvores,

Vida,

E paraíso.

doei

Doei-te palavras de poemas,

Gargalhada e choro,

Paisagens de montanhas e mar,

Foz de rios e nevoeiro,

Prados e lagos inacessíveis;

Ofereci-te a nascente de mim.

 

As minhas mãos escravas nas tuas,

Carpiram rugas não mais desfeitas,

Dentro do mesmo tempo,

Vi escuridão e luz;

A tua boca na minha,

Já é só recordação.

 

Sorvo no peito uma rocha,

Que sei ser dono de alma,

Que o meu peito já não sente,

O que sinto eu de falta,

Palavras feitas de poemas,

Adormecer na lua alta.

Mulher

Nascido de um sonho de amor,

De uma mulher sem senhor,

Que livre soube doar,

O homem que lhe calhou no amor,

A uma outra mulher,

Fiz análoga outra mulher,

Que de nome baptizei por filha,

A quem dei vida,

E me devolveu a vida a mim.

 

Mais do que as datas, faço diário este agradecimento à mulher que dei nome de filha …

porque a vida me deu esse encanto,

num ser humano chamado mulher.

21março2014

A poesia nas gavetas,

Não faz efeito,

A poesia tem que se cravar na pele,

Na carne,

No sangue,

E na alma.

 

A poesia não é singular,

A poesia é plural,

É vida declamada,

Numa boca urgente

Que sente.

 

A poesia é claridade em noite escura,

Abraço na solidão,

Água no deserto,

Mãos que se dão,

 

A Poesia detém as respostas,

Que a vida sugere,

Que a alma exige.

Morremos juntos

Quando estilhaça na minha alma o património que construí,

O teu corpo ausenta-se dos lençóis que habitámos.

Nas noites ternas de frio,

Residente na parte de fora de nós,

Os prados verdejantes que foram as nossas manhãs,

Sucumbiram à tempestade das nossas bocas,

Dos nossos corpos,

Como a mortalidade que um dia dissemos não existir.

Ruímos como o palácio,

Que foi o nosso julgado e legado de eterno amor,

Os dias somados de pele e arrepio,

Transformaram-se na agonia que agora pernoitamos,

Ausentes neste descaminhar,

Cor violeta,

Amortalhado.

 

Saudades esfaqueiam-me na canção que ouvíamos juntos,

E nos embalava no orgasmo conjunto.

 

Cantávamos: um dia seremos céu e nuvens e não teremos medo do que está para além do nevoeiro”.

 

A nossa casa ruiu quando deixámos morrer as flores do nosso jardim,

Morreu o nosso querer com o não querer do nosso querer,

Morreu o nosso querer com o não querer da nossa promessa,

Morremos juntos com eles.

As bocas, as mãos, a vontade e as palavras … entendem-se.

As bocas que não dizem as mesmas palavras,

Não são dos mesmos beijos,

E a pele não se confirma na outra.

 

As mãos que não estremecem,

São as que ficam quietas,

Na tremura de um abraço.

 

O beijo que enche a alma,

Brota dos lábios que sabe a lua,

E da boca que declara o mesmo desejo.

 

As bocas, as mãos, a vontade e as palavras … entendem-se.

Nem sempre o mar destemido e determinado é tempestade!

Aventuro-me mais agora do que outrora,

Arrisco mais a lua,

O luar,

O mar,

E a solidão.

 

Ouso mais agora do que outrora,

Tento mais eu próprio,

Escolho de dentro de mim,

E a junção de estar só comigo,

Não me causa temor da dor.

 

Escolho mais agora do que dantes,

Escolho a enseada,

O oceano,

Os poemas e os carinhos,

E não me basta receber.

 

Se receber for cobrar,

Torturo-me mais do que sempre,

Porque elejo,

Porque penso o que sinto,

E não sinto apenas o pensamento ordenar.

 

Nem sempre o mar destemido e determinado … é tempestade!

Pág. 1/2