Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cardilium

Cardilium

Enchimento da lua

 

Uma página construída por janelas que abrem horizontes de olhos pendurados no enchimento da lua...

 

Assim sendo, nos teus olhos, a janela do tempo emerge eterna...

 

Muito, é o encarceramento do tanto, e tanto é a libertação do muito…

 

Olho-te...

 

Espero-te no próximo quarto crescente com o meu amor cheio de luz da lua…

 

No teu bairro branco, as pombas arrulham no terreiro da saudade, e o teu peito farto é solidário com o afecto que encontro procurado...

 

Um barco não atraca em terra, um barco não existe num porto. Um barco é para navegar, naufragar, navegar, navegar, navegar...

 

Em cada naufrágio a bonança acena dos teus olhos quentes, coexistência do meu porto...

 

Não são as barcaças que existem nos portos, são os portos que existem nas barcaças, e assim se fez o mar, de lua e presença, de faróis que encaminham a minha alma, que me sustentam e seguram os olhos pendurados no enchimento da lua...

A paz só se altera se for demasiada

Quando respiro nevoeiro alcanço a silhueta que as arvores desenham no nascer do dia. A cada madrugada sou acordado por um bando de pássaros rumados de sul. Espreguiço-me encantado por um sorriso dado pela aurora do nascer do dia.

 

Durante anos a fio detive-me com os entardeceres, hoje, oxigeno-me com o nascer do dia e a força brutal do rompimento com a noite. Sinto que com o crescer da vida em anos, os anos modificaram o conteúdo dos dias. Passam por mim redutores sorrisos que sedutor guardo na minha algibeira para te enviar, como quando se mandam promessas azulados pelo tempo, ao lago dos milagres.

 

Está encarniçada a minha paixão, está em carne viva, por sarar.

 

Duas arvores à entrada da estreita estrada quase que se beijam, aproximando no seu cimo a folhagem entardecida, desenhando um V de vitoria. Está sossegada a paz quando existe a guerra. A paz só se altera se for demasiada.

 

Vou entretanto recolher o sabor do aroma a café que grita do velho fogão encardido pela lenha. Desfaço-me do suor do dia, sentindo a água gemer fria arrepiando-me a pele.

 

Quando piso o dia e saio para a rua sou um normal homem jorrando tímidos bons-dias e envergonhados olhares, na roupa de um normal e mais de mil delegados comerciais, com pele feita de fato cinza de morte sóbria, não súbita, mas anunciada.

Abraçamento

Em Gavinhos os homens grunhem em coro. Arrepiante. Soltam sons animalescos às fêmeas quando em grupo, e a sós roborizam nos seus pensamentos, como se eles fossem pecado, não compreendendo o quanto elas, gostariam de os saber. Pedem mais uma cerveja e soltam mais um grunhido de arroto, elas entristecem o sorriso, não abrangendo a fragilidade representada por esta falsa força, que os separam.

 

Elas gostariam de muito mais, eles também.

 

É uma questão simples que as palavras poderiam resolver nestes séculos passados.

 

O abraçamento também.

Prefácio

Inventei duzentas páginas de livro.

 

Um dia dar-lhes-ei o sol. São páginas grossas como farpas trabalhadeiras, feitas de dedos grossos de uma mulher do campo. São páginas desenfreadas e soltas, sem rumo, páginas de um devaneio desenfreado ateu e pagão. São páginas descontextualizadas de profusão profícua ou ambiciosa, encarceradas de ávidos indutores de sensibilidade (s). São páginas que não são páginas. São letras de lágrimas presentes, parágrafos passados de disfarçado humor, isentos de gargalhada, solícitos de metáforas e sorrisos. São letras mascaradas de montanhas e viagens circum-navegadas de emoções. São mentiras ditas como verdades, e verdades irreflectidas, inconvenientes e sérias.

 

Este é um livro de um constante soluçar de dias e agonia de noites indomadas. É um filho por parir com um pai por encontrar. É um livro desnascido e sem mãe. É um filho nascido de uma obra, sem graça nem desgraça, valendo pelo que não está descrito.

 

É tímido e tem átomos de cloreto com químicos associados. São duzentas páginas desta mistura que não têm afectivamente ligação, associada aos elementos que a vida constitui, não se tendo a certeza, que os elementos como o sol, o mar, o céu e as estações, não são na verdade, a única e exclusiva família do autor.

 

Sabe-se hoje e apenas, que um dia se dar-lhe-á, o sol.

Não te espero nem te aguardo

Não te espero nem te aguardo,

Vivente, existo sem ti,

Comigo serei o que sou,

Contigo serei o que vi.

 

Das mil palavras usadas,

Metade teriam bastado,

Palavras simples e pequenas,

Foram o fim anunciado,

 

Gosto de sofrer por amor,

De reflectir antes de ter,

De errar por acreditar,

De perder por viver,

 

Sem medos,

Não são cem,

Numeral ou ordinal,

Mas fazem a vida também.

Devemos evitar as pessoas que nos pisam os sonhos

Devemos evitar as pessoas que nos pisam os sonhos.

 

Concordo, acedi.

 

Mas os sonhos podem ser esmagados?

 

Claro que podem. Quando te escurecem a luz, e te pressionam a não seres tu mesmo, pela idílica ilusão de acharem que conseguem fazer com que tu sejas alguém que não és, estão numa desenfreada tentativa de castração dos teus sonhos.

 

Quando te vestem, despem, opinam, aconselham, insinuam, sugestionam, emudecem, tagarelam, e usam muito a palavra “não” e a expressão “eu sei”, acautela-te, porque daí advém o esforço de aniquilamento dos teus sonhos.

 

Concordo, voltei a aceder.

 

Quando de ti e em ti se faz noite sem razão aparente e fora de tempo, reflecte. Usa a tua viagem e regressa a ti, regressa sem teres que voltar, fica no teu tempo, na tua vida, no teu património, ensurdece e voa, abraça-te e põe-te em guarda, que a prisão está mesmo ao teu lado de grades abertas para te encarcerar, naquilo que tu não és. Se não sentes, não digas nada e vai. O teu sonho está sempre em aberto, enclausurado e esplendoroso, cheio de luz ao invés de penumbra.

 

Já reparaste não tuas mãos? Nos teus dedos? Na tua poesia? Nos acordes que dedilhas? Na forma como caminhas? Como suspiras com o olhar?

A forma como pedes ao contrário?

 

Pedir ao contrário? O que é isso?

 

Pedir ao contrário é dizer-se não, quando se quer profundamente muito.

É dizer-se sim quando nada se quer.

É dançar na hora de ler, ler na hora de dormir, e trabalhar nas horas em que não existes.

Pedir ao contrário é a anti natureza da tua entidade.

O teu temperamento é o sentido que tem seres assim como és.

Não te imiscuas de ti definhando.

 

Apenas precisamos de evitar as pessoas que nos pisam os sonhos…