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Cardilium

Cardilium

Bravo mar evadido

Bravo mar evadido,

Fugidio porto que te viu partir,

Terra de sábado aberta, braços de enlace.

 

Mar excluído de si mesmo,

Mistura de terra,

Rosto de sal vertido dos olhos.

 

Discórdia do vento com a maré,

Sublime emoção,

Ver-te assim desinquieto.

 

Quietude de alma,

Induzida pelo bravio sentir,

Do bravo mar evadido.

O cheiro dos cheiros é a soma dos aromas

O cheiro dos cheiros é a soma dos aromas. Noite morna de odores transformados em perfume. Os cheiros em transfiguração tornaram-se numa única fragrância, que as palavras não abrangem em descrição.

 

Da praça mal iluminada brotou a tonalidade laranja. Desabotoam-se das árvores penugens em forma de algodão. As mesas de madeira desocupadas agora, antes, vertiam conversas de homens que falavam com musicalidade e código ritmado, purificando a garganta com goles de vinho rosa.

 

A noite ficou mais clara quando caiu dos teus olhos calmos, maresia. As tuas mãos suplicaram a paragem do momento nas minhas. Da tua boca ouvi gemidas palavras que me consolaram, e, se esbateram nas folhas caídas das árvores. Há mil anos que esta luz cai desamparada como o teu corpo exausto, suportando os pensamentos que amontoas.

 

Do céu e da terra, do mar e de ti, do fogo e da luz, os cheiros que o meu olfacto sente, são muitos e alucinados, vindos de toda a parte, são mil transformados simplesmente num. A soma deles na tua pele, no teu andar, na tua roupa e nos teus olhos, enlouquecem este sentir que não apreendo e me prende.

 

Tantas noites assim caídas esvaziaram e esgotaram a minha alma, como se funestos devaneios e madrugadas por romper espalhassem esses cheiros, que constituíssem esse aroma confidente e melancólico, onde me acolho e sossego.

 

O cheiro dos cheiros é a soma dos aromas.

Os filhos do Almonda

“Ao rio que corre na minha terra, escrevo para sempre!”

 

O Almonda é a minha descendência,

É a corrente que me leva,

A minha foz e nascença.

 

Rio retorcido e esforçado,

Espelhado nele existe,

Reflexo de mim, nado.

 

Rio presente na minha ausência,

Fé da minha loucura,

Amor do meu desamor.

 

Quando ninguém ficava na madrugada,

Estavas tu feito de água esperança,

E açude revoltado.

 

Na levada não me faltaste,

Nas noites só com a palavra,

Rio verde, azul de alvorada.

 

A cada regresso te tenho,

Igual a cada partida,

Rio companheiro, minha vida.

Teatro

Se às prisões sociais me dou,
Feneço amarrado à glória executiva,
Da escritura lavrada sucumbida.

Se me dou retirado desta existência,
Logra a loucura em fascínio,
Num coração vertical e exíguo.

... Abalroadas as estrelas caem do céu,
Padecem em mim mil males,
Funestas preces e mares.

Esbofeteado de palavras,
Insinuo a vida e o passado,
Neste teatro desabitado.

"Ode a ceixe"

As cores são dádivas para os olhos.

Castanhos, verdes, azuis,

Distribuídos pelas rochas,

Semeadas de cactos encanto,

Agua, sal, vento e gaivotas.

 

Fardos aprumados de feno dão Alentejo à paisagem,

Dispostos à branca espuma de um mar batente,

Barcos abraçados predem-se no cais ondulante,

A faina aguarda a maré,

A esperança aguarda a divina a ordem de partida.

 

Benévolo regresso esperado,

A pele escura e sábia habita os homens deste lugar,

Vivências apalavradas,

Angustias construídas,

Decididas.

 

Não desistentes,

O mar corre feito sangue no sal das suas veias.

Cascata

Não são as folhas das árvores que definem o som do vento,

Ou a sua curvatura o envelhecimento,

É expressão lisonjeira,

Da raiz verdadeira.

E os segredos,

Expressam-se com as estações,

Amantizados,

Adorados.

 

Aproxima-se a experiencia com sabedoria,

A chuva cai em bocados de sol na Primavera.

 

Depois,

É a cascata que corre cristalina,

Abundante,

Espuma no final do caminho,

Que faz de mim eu,

E de ti também.