Os erros são sempre uma importante arma de regeneração. É como se da lapidação de um diamante se tratasse. Os erros não são crassos, são suaves se aperfeiçoados. Um erro é mau se por exaustão se repetir. Um erro é de oiro se a mente nos abrir. Já errei mais de mil vezes graças ao criador. Já repeti e reparei os meus erros. Já os esqueci e lembrei. Já os perpetuei e multipliquei. Já os dividi e reparti. Já fiz a minha sementeira de erros. Já colhi erros de semente, gérmen de vida. Errei tanto e tão pouco. Errei de ignorância. Errei de suposta sabedoria e latente certeza, o que importa, é que não me importa errar. Um homem não se faz em nove meses, um homem faz-se pelo menos numa vida, e uma vida, são sessenta anos e tal. Há tempo. O tempo urge no erro. Existe uma vida para aperfeiçoar. Por vezes tenho vontade de errar intencionalmente. Errar com palavras, deixar sair de mim, do meu âmago, do meu mais fundo e profundo sentir, um chorrilho de disparates direccionados objectivamente das mais vernáculas palavras que existirem e me ocorrerem, e deixar-me assim errar pela paz do desabafo em cascata. Conter-me é um erro e uma benfeitoria. Um erro por me amaldiçoar, um melhoramento por não ter duas vias de sentido. Um erro é como andar a cento e oitenta em contramão, ou como estar sentado numa pedra no alto da serra que se espreguiça da minha janela, a tocar uma musica sem saber que musica é. Errar é paz e guerra, vinho e sangue, descoberta e sensatez. Um erro é a desumanização da humanidade se à humanidade for imputado. Um homem feio pode existir por detrás de um belo poeta, e por detrás de um mau poeta pode existir um homem belo. As aparências são erros de apreciação. Troçar é uma fuga de nós próprios, é um erro mais que ao troçado, feito à ignorância do troçador. Por isso te entendo quando me dizes “agora não quero falar disso, gosto das coisas levezinhas”, pois, e eu não sou o Nikki (nome fictício), ao invés..... Eu penso, erro, vejo sombras :-) e melhoro. às vezes....
A morte como evento social. É como a sinto amiudadamente, tais são os artigos de opinião, a proximidade pseudo-latente, a transformação lacaia e serviçal de agradar e deter palavras de circunstância, como se fossem necessárias ou obrigatórias, numa hora em que o sentido é recolhimento, e em sabedoria, afastamento. Aquando a hora chegada da partida, logo se arvoram vozes despontes de uma surdina aterradora, ressuscitando conselhos dados, identificações não resultantes, juízos de valor de pares iguais, ignorados e esquecidos momentos solidários do carpir das mágoas em catarse, que se queriam solitárias. Depois existe um fenómeno que me aborrece de sobremaneira, o acesso indiscriminado e desrespeitoso do facebook e de comentários avaliativos e quantitativos, de quem outrora devia estar sossegado sob a emissão de desentendimentos de razão, mais que o entendimento da emoção. A decisão de pertença e identificação a um grupo, é tão valida quando a ele se pertence, ou quando a ele se decide não pertencer. Pertenço a um grupo fechado que não o é afinal. Dos fracos não reza a historia, a morte é apenas o descanso da vida, independentemente de ser uma escolha ou um acidente, Independentemente de estarmos ou não de acordo com a decisão final, independentemente da frustração egoística da saudade...
Afinal o que nos dói é sabermos que estamos ali, do mesmo lado daquela linha ténue e indefinida. Indefinidamente, só por hoje, ou não?
Faça chuva ou faça jazz, faça fado ou chova ternura, os teus braços incandescentes são de marfim aventura, porto de abrigo, descoberta, sonho presente, existência. A voz do vento é como a voz do silêncio. Ora brada, ora se cala. Neste dia, há uns velhos dias atrás, que somam já anos, peguei-te. Peguei-te entre os meus dedos dentro das minhas mãos, e fiz duas promessas. Uma a ti, outra a mim. Talvez seja o meu prometimento único e cumprido. Sem vaidade ou falsa modéstia, sou um Pai, e ser um Pai não é igual a ser pai. Os dias têm um fim, para os seguintes poderem ser melhores. Tão próximo e fervente é o que sinto, que as palavras só me atrapalham neste momento. Parabéns filhota e obrigado por cuidarmos assim um do outro, desta forma simples de grandeza e aceitação, de presença e afecto. A ti, também te devo o homem transformado que sou. De ti renasci. A nossa historia, contar-se-ia facilmente da frente para trás, embora se tenha vivido de trás para a frente. Amo-te, sem receio algum de gritar esta palavra.
A marca da amizade presente (carta ao meu amigo sobrevivente)
A marca? ... Já tenho.
A marca, essa coisa por que se é conhecido. A marca do sol deixa a pele queimada. A marca do frio escurece a tez e analogamente a deixa queimada. A nódoa é a marca da sujidade. Sem mácula é a marca de coisa nenhuma aparente. A minha marca já a tenho, as minhas danadas marcas, as minhas transformadas marcas, as minhas marcas amanhadas, as minhas imaculadas marcas, as minhas marcas alteradas, o meu futuro sustentando nas marcas, o meu passado de marcas de verdade, o meu dia marcado, a minha noite marcada, a mulher que me marcou, o dia que me marcou, a musica que me marcou, a morte que me marcou, a viagem que me marcou, o efémero que a marca tem, o definitivo que a marca oferece, a marca de dor, a marca de paixão, a marca da distancia e da saudade, a marca da presença, a agonia marcada e a marca da fé. A marca da amizade presente, a marca da verdade e da mentira, a marca em transformação e metamorfose da marca. A marca do pintor que pinta e do escritor que escreve. A marca existe, importa, acarreta e induz. A marca sara e sangra. A marca é património e fortuna, desgraça e amplitude. A marca da nostalgia e do desespero, a marca da moda e do antiquado. As marcas não são apenas as marcas. A marca que nos marca marca-nos os dias, a vida, a decisão, a expressão, a luz, as lágrimas, o sorriso e o olhar. No olhar, se eleitos formos, detectamos as marcas, translúcidas de confiança ou o envergonhamento olhado pela timidez. A marca da vingança pelo olhar não olhado. A marca do amor pelos lábios enfeitados. A marca da carência pelos dedos no cabelo passados. As marcas da altivez, na forma de como as passadas são oferecidas. A marca da humildade pelo conjunto sereno da marca. As marcas não interessam coisa nenhuma na sua forma ostentada, e são a essência principal na sua forma humanizada. A marca está cá, sangrada e sarada no mesmo acto.
Tu tens a marca da humildade pelo conjunto sereno que vestes.
Ladrões do tempo, seres ausentes que passam pela nossa vida e nada acrescentam, apenas roubam a preciosidade rara do um período irrecuperável, essa predisposição para a felicidade, que nos torna votantes de uma abstenção violenta mas construtiva. Inocência, ingenuidade, desencanto. A infância é o que nos molda e nos rouba pedaços de vida, fragmentos da alma. Necessito contar os contos da minha infância. Ora elixir, ora abstracção e castração. Psicodrama do menino que habita em mim. Jogo de fazer ressurgir comportamentos. Fantasias e afectos. Modificação e desenvolvimento de personalidade. Criança que ri e dança e se sossega, como se de um auto terapeuta se acolhesse. Continuo a entender e a sonhar junto com as crianças, esse mundo de fantasia e astúcia. Esse bando de alegria a caminho da tristeza e responsabilidade. A caminho da mudança da frescura, pelo azedo negro e defensivo do medo da angústia da idade. Gosto tanto de ler como de escrever, mas leio melhor do que escrevo. Abençoo-me e parto nesse dia ultimo, inicio de primeiro. Ladrões do tempo. Ausência consciente da medida fecundada, de partículas que não escolhi ou assinalei. Tenho tempo, não tenho o tempo. Tenho o meu tempo.
Existe o luto que se faz sem ter que se fazer, e há os que necessariamente são feitos, queira-se ou não se queira. Lutos por pessoas, pela vida, por momentos. Lutos proibidos feitos em silêncio. Lutos patológicos e psicossomáticos, onde as dores de verdade se transformam em dores que não o eram. Lutos homofóbicos, nas suas mais cruéis e reais vertentes. Lutos de pós-vida e pré-morte. Como devem agonizar os cuidantes dos lutos, que colmatam as dores com carinho e tiques de feitio e personalidade. Diante da morte, a religião retira ou diminui a ansiedade do fim da estação. Transforma-a no conceito de passagem. Afinal a fé, é um tapa-buracos, ou não é um tapa-buracos, mas sim um ajustamento vanglorioso, que remenda as essências espirituais, que dá alguma coerência temporal. As técnicas crescem e desenvolvem-se em redor da morte, da vida, da aceitação, da dor e dos lutos. Depois, de apêndice em apêndice, cada um sabe de si. As artes evoluem, mas não suprem a humanidade latente, que escasseia onde devia abundar. As melhores palavras de conforto são ditas em voz alta e estridente, no silêncio de um abraço. O mutismo da presença da espiritualidade espera pela etapa seguinte pacientemente. A vida é inevitavelmente a morte. É por aí que os sinos dobram.
O que é um homem morto? Não será uma a notícia declarada à nascença?
Mãe, nesse dia um de Novembro em que toda a gente vai, eu não vou. Já devias calcular isso, presumo eu. A mim não me leves flores ou limpes o meu jazigo. Já não é preciso, já não estou, antes em vida pronunciasses o meu nome. Estava cheio, o sítio que cobre de terra os mortos. Tinha flores. Cá fora como oportunidade, lá dentro como competição. A mim não me apanham lá concerteza, vou caber no sítio muito pequenino, e vou voar por aí, depois de me encontrar com o rio. Não fui, não vou, e não irei fazer esse papel que me agonia. Aproveitarei antes, para dizer em vida os nomes levantados do chão de quem gosto, mesmo desgostado. É por aí que dobram os sinos, já te disse. Vai com o primo que tem jeito para a coisa, ou com quem tu quiseres, mas eu não vou. Eu faço os meus lutos e não tenho que os pronunciar, habituei-me a darem e a não darem pela minha presença ou falta. Para mim vai dar ao mesmo. O que vale mesmo, são as broas que a mulher do “Toinho Júlio”faz.
Primeiro de Novembro, de todos os anos a mesma coisa, para nao dizer a mesma merda.
Suspirar é respirar pelo coração, respondi eu, de cada vez que me perguntaste o que significava aquele respirar tão profundo, aqueloutro expirar que te fazia parecer, que fugia de dentro de mim, um bando de pássaros desarvorados, que desenhavam círculos no céu, que pareciam brincos de pérolas muito brancas, quase translúcidas, como os pensamentos que teimavas em ler, e que se exprimiam apenas naquele ar suspirado, ora forte, ora suave e imperceptível. Acontecia madrugada no nascimento pianinho do sol abraçado e geminado, acalorando o dia de esperança e fé, aquela fé renunciada pela revolta da incerteza do próximo momento. Preciso de momentos meus. Quão difícil é achar o meu prolongamento visceral, a minha história para contar. Os meus dedos entrelaçados na música que componho e que nunca ninguém ouviu, precisam de libertação. Quão difícil é, abraçar e sentir o tempo parado no mundo, e saber que se o mafarrico chegar me protegerá, como se aquele abraço fosse um exército de guardiões e cuidasse da minha alma. Já senti o conforto gestativo de não temer. Já experimentei o excesso emocional de aceitar as decisões que não tomo para mim. Noves fora nada, é nada. Dá resto zero. Zero é o que tenho, o que construi, o que senti. Suspirar é sussurrar pelo coração, é desabafar, mentir e dizer a verdade, ser eu e o outro, o mar e a rebeldia, a indecisão e o vento, o ódio transformado em amor, a abundância em miséria, a morte antes da vida e a vida depois da morte. É com um suspiro que se acaba. É com um gemido que a viagem termina, seja pequena ou grande, de noite ou dia, é com o queixume que nos despedimos, antes de expirarmos um olhar de saudade.