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Cardilium

Cardilium

A irritante historia dos Gps

 

A irritante historia dos Gps. Conduzia eu atrás de um Skoda não sei das quantas, vislumbrei um aparelho desses que sei marcar o trajecto de casa para o trabalho, e do trabalho para casa, antes que se percam no itinerário que o carro faria até sozinho sem o idiota ao volante que o conduz. Para ir a qualquer sítio neste País será preciso tal aparelhómetro. O prazer de nos perdermos foi substituído por uma voz irritante que analogamente só me faz lembrar uma boneca insuflável, vá-se lá saber porquê. O conceito no meu entendimento é o mesmo. Se não vejamos. Perdermo-nos, dá-nos a oportunidade de descobrimos os nossos próprios itinerários, e o prazer de fazer as nossas próprias escolhas e caminhos. Foi sempre assim comigo. Foi perdendo-me que me encontrei e escolhi. Como sou muito teimoso, estou-me a ver ao comando de uma voz certinha e irritante. Se me mandasse para a direita iria para a esquerda e vice-versa, certamente. Vejo-me ao fim de dois quilómetros a parar e mandar o aparelho ao chão. Saltar-lhe em cima aos pés juntos até ver as tripas, o esófago e o fígado separados numa morte irrecuperável. Imagino-me a espumar-me pela boca repleta de palavrões. Morte ao Gps, que voltem os mapas, mesmo os desactualizados. Que volte o espírito de viajante mais do que o de turista. Que o direito ao erro e o engano volte, e nos faça saber mais do que um carreiro sinalizado por satélite que nos retira liberdade. Que os alternativos sejam circulados e visitados e não se enviem todos pelo mesmo caminho. Desceriam os engarrafamentos e até as mortes na estrada. Que nome mais paneleiroso, tomtom. Com voz de boneca insuflável de lábios grossos e vermelhos. Vivam as estradas de terra batida, os atalhos, e os montes. Nós quinhentistas que demos novos mundos ao mundo de gps tomtom.

Plagio

 

Desilusão continuada numa data de alegorias e plágios. Uma data de ideias onde a criatividade não abunda. Plagio não é apenas copy / paste. Plagio é também isenção de ideias e ficar preso a um chorrilho de disparates repetidos e auto-piedosos. É inspirarmo-nos nos outros para falar de nós em jeito de contraditório. Seborreia mental plena. Desilusão. Desilusão é o que tenho sentido recorrentemente na minha vida e que de alguma maneira me faz ser quem sou. Desilusão traz-me desconfiança, vontade de não arriscar, isolamento e até julgamentos que sei não serem coerentes, muitos deles baseados apenas nessa desilusão. Ontem falava já madrugada alta, que é o meu dia, com alguém que me dizia entre outras coisas “entendo-te, como eu te entendo” e fazia-me sentir o meu sentir, um sentir não extravagante, não utópico e não lunático. Obrigado pela frase curta e tão cheia de mim. Hoje durante o meu dia algumas vezes em forma de comichão cognitiva ela me bailou na cabeça e semeou um sorriso nos meus lábios sisudos de normalidade.

A paridade da destruição criativa

 

Debruço-me hoje sobre finais. Finais são sempre estados de espírito diferenciados e de não fácil, ou difícil execução e aceitação. Os finais são a oportunidade dada aos inícios e normalmente a oxigenação da vida. Sabendo nós que o oxigénio é elemento fundamental no processo clorofílico, entende-se então como essencial à vida inicial, o final. Inevitavelmente o processo do bonzinho esvai-se na mentira que foi essa própria criação de outrem. Esgota-se igualmente a besta criada e posterior, que não se ajusta exactamente à terrível criação. Nem sempre nem nunca, nem oito nem oitenta. Diz o povo que a virtude está no meio, que metaforicamente se poderá entender, como o fiel de uma balança que é a vida e o equilíbrio que se procura nas crises, finais e inícios. A crise assim dita induzida por um qualquer final, não é mais, do que tão-somente a oportunidade criativa para reinventar a nossa essência perdida na agradabilidade ao outro. O azeite sendo a verdade é mais leve que a agua sendo a mentira. O fascismo ou a guerra gerou sempre em novos países “lufadas” de ar fresco e valor pela vida. Depois da tempestade vem a bonança e nem tudo o que luz é oiro.
 
“A destruição criativa ou destruição criadora em economia é um conceito popularizado pelo economista austríaco Joseph Schumpeter no seu livro Capitalismo, Socialismo e Democracia (1942). Ela descreve o processo de inovação, que tem lugar numa economia de mercado em que novos produtos destroem empresas velhas e antigos modelos de negócios. Para Schumpeter, as inovações dos empresários são a força motriz do crescimento económico sustentado a longo prazo, apesar de que poderia destruir a estrada, no valor de empresas bem estabelecidas.
"O processo de destruição criadora" escreveu Schumpeter em letras maiúsculas, "é o facto essencial do capitalismo", com o seu protagonista central do empresário inovador”.
 
É o mesmo com a oxigenação da vida nos “finais”, e a paridade da destruição criativa.

Mudam-se os tempos mudam-se as vontades?

 

Tão patética esta ternura da distancia. Estes telefonemas multi-diários. Nestes dias últimos sinto-me mais forte depois uma longa e cheia de ninguém caminhada veraneante, já entrada na estação seguinte. Verifico-me assim na quadra.
 
- A Cantiga de Escárnio é aquela em que a sátira se constrói indirectamente, por meio da ironia e do sarcasmo, usando palavras cobertas para que hajam dois entendimentos “lhe lo não entende rem",
 
- Na Cantiga de Maldizer, a sátira é feita directamente, com agressividade, "mais descobertamente", “com palavras que querem dizer mal e não haverão outro entendimento senão aquele que querem dizer “chãmente”.
 
Essas duas formas de cantiga satírica, não raro escritas pelos mesmos trovadores que compunham poesia lírico-amorosa, expressavam, como é fácil depreender, o modo de sentir e de ver o próprio de ambientes dissolutos, e acabaram por ser canções de vida boémia e escorraçada, aquela que encontrava nos meios frascários e tabernários seu lugar ideal. A linguagem em que eram vazadas admitia, por isso mesmo, expressões licenciosas ou de baixo-calão: poesia "forte", descambando para a pornografia ou o mau gosto, possui escasso valor estético, mas em contrapartida documenta os meios populares do tempo, na sua linguagem e nos seus costumes, com uma flagrância de reportagem viva.
 

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades?

Viva. Viva a dança dos pássaros

 

São milagrosas estas linhas que me habituei a escrever. Paradigma de mim mesmo. Numa metáfora circense diria que a minha escrita é legista. Legista, como um médico que abre e vê o adormecimento eterno. Por ordem sequencial deste pensamento, entendo também que escrevo como uma médica parteira, que dá vida ou ajuda a dá-la. Assim me encontro numa escrita aberta, a que chamo legista, por avistar por dentro. Por outro lado, antevejo-me numa escrita naturista, que dá vida à própria vida e pronúncia ás palavras. Esta forma solitária e snobe que os escritores têm, arredado das suas leituras, chamo reflexiva. Escrever para alem de ser reflexivo é filosófico. Parte do desconhecido para a significação, quase sempre egoísta e de dúbia interpretação. Uma dança de pássaros pode ser uma dança de pássaros, ou o seu próprio entendimento. Pode ser partida ou chegada. Amor e desamor. Saúde ou doença. Pode ser uma poética forma musicada de dúvida. Uma duvidosa mudança de estação. Uma estação filosófica para o entendimento. A junção de conceitos e fundamentos expressos na observação, descritas nas palavras. Como diria uma concubina de expressão infantil na cara enfeitada de entusiasmo.
 
Viva. Viva a dança dos pássaros.

Disruptivo

 

O mar a espraiar-se na areia,

Gaivotas de arrulho pendido,

A cacimba envolvente.

O sol a cair desprendido no mar,

Cascatas submissas do poder da gravidade,

Fazem da água solta a minha música preferida.

 

Rebuliço esplendoroso,

Fonte do meu ser,

Amor mais que miséria.

Emocional mais que intelectual,

Soltam-se as amarras dos meses passados,

De ideias mais que ideais.

 

Voltei a sorrir sem motivo,

Deixei as lágrimas entregues sem remetente,

Na caruma onde fiz a minha cama.

Continua no pinhal cheiroso de resina,

E luz dependurada pelo luar,

Farto de não ser sentido.

 

Escolho o sentido,

Escolho o caminho, e vou.

 

 

 

 

Dar: - palavra escassa, invulgar, quase extinta

 

É de porcelana o meu eu. Loiça de especial ocasião. Na vulgaridade destemida de me perder encontrado, encanto-me. Encanto-me num sentido desilusório da soma das gentes que vou afectando, distanciando-me. No meu caminho serei outra coisa qualquer para alem do que sou. “Vais ter mais filhos”, disseram-me. Já não questiono se creio. Não creio sequer se questiono. Gosto da serra que desci desembalado e isento de opinião, desprovido, e esvaziado das raivas que me assolam, de incompreendidas compreensões. Desci sozinho, desci em paz. As estrelas magas juntas e bailarinas em bicos dos pés, saudaram a minha passagem. Nas moitas a bicharada escondia-se dos humanóides. Sábias. Sinto uma voluntária força dentro de mim, que se perde nesta terra que frequento. Indeciso, pressuponho-me num chão onde pudesse dar e fazer. Sem matéria atrás de mim, apenas afectos e letras juntadas para ensinar. Somente números primos e compostos da teoria dos números, compondo o fundamental teorema da álgebra, a quem não tem sequer iogurtes dentro ou fora de prazo para degustar. Vejo-me numa pátria irmanada, trocando notas soltas de uma escala, de quem já nasce naturalmente com o ritmo que me esforço por ter. Revejo-me a erguer muros e destruir barreiras interiores e pardacentas. Vejo-me a rir, construir, partilhar. O que faço aqui? Porque não vou? A mensagem chegou o mensageiro partiu. Arauto de mim fará um dia terra minha, longe daqui. Por mim, pelo que tenho para dar.
 
Dar: - palavra escassa, invulgar, quase extinta.

Outra margem

 

O barco balança ritmado pela maré. A viagem para a outra margem começa onde o sol me acena crescente. O dia quase rompe dentro de mim. De olhos impenetráveis, estoura dentro de mim imagens felizes da minha alma. Balanceiam-se ao vento cabelos longos de um Maio já maduro. Descalça num chilrear alvoroçado, as gaivotas fazem tangentes. Malucas. Num divertimento de quem não tem preocupação. A margem insinua-se cada vez mais, ali num fumegante nevoeiro que se espreguiça e levanta. Aprendiz de feiticeira esta luz inconstante, velha e sabia. O oriente sonha com a forma como me conduzes e guias. Sonho com o teu abraço incestuoso, até. Com as tuas palavras molhadas de desejo que reprimes num jogo alucinado que me fascina. Prendem-me decisões que adio. Tomadas e adiadas sem coragem, de um bater a porta digno e definitivo. Escrever diz me tanto, tão mais do que palavras ditas de incongruência de um sentido duvidoso. Escrever adequa me e ajusta-me, à verdadeira forma não dita, de um conteúdo adivinhado, carente e obvio. Hoje por motivos não descritos é realmente o dia mais importante que tenho. Apenas porque não tenho outro. Desejo agora um mar de afecto à minha frente, um livro, um cd, e tu doida inventada por mim. Ser por inteiro. A forma de te mexeres esta dentro de mim, os teus sons e gestos, a forma presa de sentir. Um sentir de desprendimento. Acredito na normalidade das coisas. Afinal sou um tipo normalíssimo. O sol escondeu-se. 

ABRAÇO FORTE

 

08.57 - Abro os sistemas operativos com que trabalho. Abro o meu correio e electrónico e revejo-te. Leio:
 
“Olá Jorge
 
É só para te dar um beijo. Guardo te.
Leio-te gosto, tornou-se um hábito.
Estive na argentina, adorei.... Mando te umas fotografias, não tenho muita paciência, guardo – as, não tenho muito jeito para contar.
Beijo gdr força... apesar de não falarmos.... Se quiseres escreve... aquilo que te apetecer e que te der na real gana.
ABRAÇO FORTE”
 
É esta disponibilidade que sei sincera e sentida que me escalda. É esta forma de sentir que sei verdade. Este abraço que sei sentido. O tempo parou empático nesta forma forte de gostar. Também guardo a saudade, quero-a. Guardo as noites e as viagens. O começo e o final.

Texto 301

 

Agua nascente brava e cristalina comprometida entre duas serras. Embravecida no passar revoltoso do estreito e espraiada na foz verde musgosa da foz. A recordação do teu rosto não me deixa. A forma como os teus baços olhos partiram, num sinal de luz apressado e urgente. Semana acabada numa cordilheira de vales assustadores. Beleza que corta cada curva dada. Íngreme este molde do pensamento mesclado de tortura. O perfume das searas cortadas salpica a passagem. Circulares as pedras da calçada que rotundam o castelo. O mar adivinhado por detrás dos montes tem pedaços de terra fértil. O calcário destroça-se em pedaços milenares embranquecendo a verde floresta virgem. Sou mais arenoso que rude. Passeio-me sob pétalas brancas suspensas em escadarias de pedra fria e gasta. O tacto faz do paladar alegoria. Os mitos que defendo e dependo abrem-me o mundo que calcorreio. Sereno nesta alavancada forma de estar. As minhas mãos percorrem a noite de lua crescente. Espero sinais da evolução criativa que semeio. A troca gasosa que forneço em espirais coloridas de um pensamento crítico que espero acasalar. Fomento em mim perdido, a vontade de decifrar o sentimento castro, mais que o sossego. Adormeço extenuado no leito de um rio que corre dentro de mim. Profundo e revoltado, feito de cristal, com fundo de diamantes. Terreno garimpo por garimpar. A minha almofada é a ilusão de me dar.

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